Há um exercício gráfico ao qual nunca resisto:
a distorção da lente do que penso,
a passar pela nitidez da lente da câmera,
a olhar para a distorção da lente da água.
“O individualismo perde um bocadinho a força quando a Natureza tem esta dimensão esmagadora“
Serve esta imagem para enviar daqui da água fria deste projecto a missiva de que se compreende melhor – nos fjords da Noruega – o porquê do desidérico Elogio à Loucura que tanto contribuíu para separar igrejas e, consequentemente, éticas. Nada se afigura fácil na vida nórdica, pelo menos nos séculos pré-petróleo que formataram esta gente. Não há – por assim dizer – “almoços grátis” nem a expectativa de que algo recebido agora seja devolvido sob outra forma mais adiante. O mar é, em Portugal, a única força natural que mata com displicência os incautos – aqui a lista é mais longa.
O individualismo perde um bocadinho a força quando a Natureza tem esta dimensão esmagadora – os noruegueses têm milénios de confiança uns nos outros, converteram essa confiança em sistema social; nós em Portugal desconfiamos oficialmente do sistema desde antes de Padre António Vieira, porque – tirando o mar – a natureza proporciona-nos essa possibilidade.
A arte só acontece com a barriga cheia.
Esta foto é um exercício gráfico ao qual nunca resisto: a distorção da lente do que penso, a passar pela nitidez do que é visto pela lente da câmera, a olhar para a distorção que a lente da água produz.